sexta-feira, 13 de julho de 2012

TÁ PARADO POR QUE?

Por Marcelo Lopes

A mudança dos paradigmas que regem as questões da produção cultural nos dias atuais propõe um novo olhar sobre nosso comportamento frente a dinâmica do acesso a conteúdos novos e antigos.
Até bem pouco tempo o mundo vivia uma realidade ancorada apenas no sentido da propriedade (material) das coisas: quem queria gravar uma música, produzir um vídeo ou publicar um livro, dependia de uma estrutura muito bem articulada que pertencia quase que exclusivamente a empresas de portes consideráveis, como produtoras, editoras e outras instituições afins capazes de viabilizar propostas desse tipo. Para produzir, reproduzir, distribuir, divulgar, tornar visível e movimentar uma rede de mecanismos econômicos haveria custos dos quais nós, como meros mortais não disporíamos, mas que estas instituições se encarregariam de possibilitar mediante algo como noventa por cento do retorno financeiro e direitos autorais. Além das taxas, logicamente.
Este modelo da propriedade física e intelectual vem se tornando obsoleto. Em seu lugar vem ganhando espaço o sentido de compartilhamento, nascido em função do acesso facilitado a bens de consumo diversos, sobretudo àqueles ligados a tecnologia da comunicação, agora muito mais incorporada ao nosso cotidiano. Este novo modo de lidar com a informação, a produção artística e intelectual não exige as mesmas logísticas, as mesmas estruturas materiais nem os mesmos mecanismos de ligação entre produto e consumidor.
Neste cenário, o consumidor tem – potencialmente - deixado de ser passivo, sem voz, apenas um receptor de ideias, produtos e conceitos acessados de forma verticalizada e unilateral; passou também a interagir com o processo de construção daquilo que consome. E mais: começou a produzir, uma vez que tempo e espaço se relativizaram pelos avanços tecnológicos à disposição, dos quais o mais estratégico e importante é a internet.
O barateamento de equipamentos que dão suporte a transmissão e registros da imagem (câmeras, plataformas de produção de textos, vídeos, comunicação etc.), aliada a incorporação de linguagens audiovisuais de forma cada dia mais orgânica junto as novas gerações, possibilitaram esta realidade de compartilhamento, que prescinde da figura intermediária das grandes produtoras, gravadoras, das empresas que anteriormente detinham o monopólio da produção e comunicação de grande alcance.
Produzir e disponibilizar passaram a ser termos corriqueiros na linguagem popular, reflexo de uma realidade cada dia mais presente, que permite a expressão – para o bem ou para o mal – de qualquer conteúdo, originado tanto por um estudante do ensino fundamental de uma cidadezinha desconhecida com menos de cinco mil habitantes, quanto o mais bem articulado escritor da atualidade. O ambiente em que transitam estas informações é o mesmo para os dois. Cada um ao seu tempo se difere quanto ao domínio da linguagem, e linguagem sempre foi signo de poder, uma constatação que não tem previsão de mudança. Afora isto, é visível a tendência da descentralização da produção de bens culturais, econômicos, de expressões sociais e assim por diante.
Fica como ilustração deste tema o blog CINEMADE RUA, uma coletânea de diversos olhares sobre a vida nas grandes cidades, com o subtítulo de “microdocumentários urbanos, breves narrativas na metrópole”. São produções audiovisuais de novos realizadores, hospedadas no site Vimeo, dotadas de linguagens livres, múltiplas, generosas e detalhistas, que buscam temas variados da agitada vida urbana.
A experimentação deste novo paradigma – como fez e faz com aqueles que produzem estes vídeos – estimula uma prática da opinião, que é prima-irmã da crítica, e nos faz exercitar a dimensão do protagonismo. Em meio a este mundo em processo de mudança há quem diga que não há espaço para inércia. Infelizmente, acredito que ainda há sim, mas não por tão drástica falta de opções como antes.

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