segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Você paga os dez por cento ao garçom?


Por Marcelo Lopes

Sergio Buarque de Holanda, em seu livro Raízes do Brasil, analisa perfeitamente o perfil do homem brasileiro, naquilo que ele classificou como o “homem cordial”. Diferente do que possa parecer, o termo cordial não tem nada a ver com “bonzinho” ou “bom caráter”; tem origem nas “cordas do coração”, na noção de sentimento, passionalidade, naquilo que faz as relações pessoais serem mais fortes que as leis, a ordem e a hierarquia. Daí deriva a dificuldade que temos separar o que é público - do interesse de todos, submetido a regras coletivas - daquilo que é privado, da alçada individual, na base do farinha-pouca-meu-pirão-primeiro.

Incorporado a essa nossa ibérica, a ideia do jeitinho brasileiro, que sempre burla de alguma forma o que é estabelecido para todos em favor de um ou outro, se manifesta na nossa “cultura”, nos menores detalhes; da furadazinha inocente na fila do banco à ideia de que tirar uma vantagemzinha mínima - só desta vez - não prejudica ninguém. Desconstruir tudo isso é um exercício diário, um desafio para todos nós – você e eu, inclusive. Não se engane.

Existe entre a educação e a cultura um vínculo íntimo, uma linha mais grossa que sal de churrasco. O conceito de cultura envolve elementos constitutivos como comportamento, crenças, manifestações das mais sutis às mais expressivas, individual ou coletivamente. Por isso, naquelas horas em que a gente mal para pra pensar nessas coisas é que o nível de consciência internalizada que cultivamos faz a diferença de postura. Assim, faço a pergunta, e tão prontamente quanto questiono, sem pensar me responda: você paga os dez por cento ao garçom?

Parece uma pergunta idiota, mas raciocine comigo: aqueles 10% é o que chamamos de gorjeta embutida. Pagamos a conta e junto com ela vai também um valor destinado ao funcionário que nos atendeu. Em alguns casos vale muito à pena gratificar quem nos atende tão bem num bar, restaurante ou outro lugar qualquer. Outras vezes nem tanto – e nestes casos nossa vontade ou atitude é de não pagar mesmo. O cerne da questão é: essa gratificação vai mesmo para o funcionário daquele estabelecimento?

Como a cultura também passa por situações corriqueiras como esta, levanto mais este assunto, desta vez como consumidor. Os espaços que chamamos de socializáveis, de encontros e entretenimento, muitas vezes com apresentações musicais, só funcionam com a manutenção de uma logística de atendimento. São inúmeros funcionários em pesadas jornadas de trabalho, que avançam noite à dentro e recebem, geralmente, muito pouco. Não raro, pergunto a quem me atende num bar se de fato ele recebe aquela parcela acoplada à “dolorosa”. Infelizmente, a resposta cada vez mais frequente é um “não” indignado. Não sei qual é a cidade de quem lê este texto nem o percentual de incidência dessa situação na sua região, mas tenho detectado isso, em maior ou menor grau, em boa parte dos lugares que conheço e/ou frequento. Há sim, aqueles que de fato repassam, mas estes têm se tornado quase uma exceção.

Acredito que a gorjeta seja realmente um modo de reconhecer o bom trabalho. O problema é que, como nem sempre esse valor vai para quem nos atende, comecei a fazer cálculos interessantes. Voltemos um pouco aos problemas de matemática da escola (eu sabia que um dia eu iria achar um uso para aquilo tudo!): 

1) Num bar que cobra em média R$ 50,00, por mesa e tem cerca de 30 mesas no estabelecimento, levando em conta que cada mesa é usada cerca de oito vezes por dia, quanto é arrecado diariamente somente com a cobrança dos 10% do garçom?

Vejamos:
10% de R$ 50,00 = R$ 5,00 por mesa x 30= R$ 150,00 x 08 = R$ 1.200,00 por dia. 

Ou seja, se contarmos somente os valores do final de semana a conta triplica. Este número – em tese – é somente o valor adicional à conta, uma vez que os valores cobrados no consumo e no serviço já vêm agregados àquilo que está descrito nos preços. O restante do raciocínio lógico fica a critério de quem quiser especular seus próprios números.

Claro que a realidade dos fatos não é tão preto e branco assim e há sim aqueles proprietários de estabelecimentos que lutam bravamente contra uma carga de impostos acachapante e uma rotina infeliz de trabalho para oferecer um bom serviço. Mas também é inegável que, mesmo com estes dados obviamente hipotéticos, esta lógica é bem próxima do existente e se enquadra perfeitamente à realidade dos nossos dias e noites de lazer. Principalmente na de qualquer atendente que ganha em média um salário mínimo. Sem acréscimos.

Gorjeta também para o pessoal do hotel
O consumo consciente é mais que comprar um produto biodegradável. É saber que existem direitos e deveres e não se constranger com em requerê-los ou cumpri-los. Aprender lidar com nossa relação cordial/pessoal em tudo o que fazemos é parte daquela desconstrução de que falei.

Só mais uma coisa: recomendo não deixar de dar os 10% ao garçom. Mas gratifique-o diretamente, sem agregar o valor à conta. Ganham todos: aquele que faz um bom trabalho, o proprietário que cobra honestamente; o consumidor que deixa de ser lesado no serviço; e o mau funcionário, que vai precisar rever sua forma de lidar com o cliente.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

O Festival de Inverno Bahia perdeu o tato


Por Marcelo Lopes

Compartilho aqui uma impressão pessoal que encontra cada vez mais ressonância por todo o lado em Vitória da Conquista: o Festival de Inverno Bahia perdeu o tato. Compreendo que o evento é uma iniciativa privada (logo, visa lucro), que faz parte de um dos empreendimentos mais visíveis da Rede Bahia, por meio da sua principal empresa promotora de eventos, a Icontent. Entendo ainda que uma empreitada de mercado deste porte nem sempre (aliás, infelizmente e quase sempre) não se afina com o que há de mais primoroso na música. Mas acompanhem o meu raciocínio:


Foto: Ana Paula Marques / O Rebucetê
1. O FIB nasceu da exploração de um potencial para espetáculos musicais que não era mais atendida na região após o fim de experiências como o Agosto de Rock (2001-2003) e outras iniciativas locais que primavam por estruturar espaços alternativos à indústria do Axé. Inspirou-se também no Festival de Inverno de Lençóis, com suas atrações de peso e artistas renomados da MPB; um evento que, à época, despertou os olhares de um público diferenciado e fomentou a economia criativa da região de forma contundente. Partindo destas referências, a criação do FIB foi lógica e inteligente, oferecendo um espaço voltado para este perfil de evento em Conquista, com características diferentes das “festas de camisa” que eram a única oferta estruturada de apresentações musicais no interior da Bahia.

2. Buscando se moldar como um Festival de Verão de Salvador, o FIB adaptou bem a fórmula e soube respeitar as características locais, explorando o apelo do inverno, numa escolha estratégica de Conquista como sede - uma das cidades mais frias do interior da Bahia. Soube também ocupar as lacunas latentes para o pop rock, uma vez que tudo mais nesta área era a mesma coisa. Além de dar visibilidade e retornos diretos e indiretos para a Rede Bahia, a realização se tornou um novo espaço para atrações importantes do cenário nacional, oportunizando uma espécie de reserva de mercado para este mesmo pop rock.

3. Era de se pensar que depois de certo tempo de realizações, o FIB visasse acrescentar ideias que denotassem avanço. Paradoxalmente, num momento em que se poderia pensar em trazer ao menos uma atração internacional (já que nos últimos anos o Brasil se tornou roteiro de shows de todo o mundo), o evento se redireciona para apresentar uma grade repetitiva e destoada nas suas atrações. Desde 2010, a produção se utiliza do discurso da “mistura”, como no Festival de Verão, para abrir espaços para o Sertanejo e o Axé no meio da programação, o que resultou este ano numa configuração estranha do FIB. 

4. Os espaços alternativos do evento não dão mais conta de inovar e o palco principal se limita a insistir que o pop brasileiro não se renova, em plena fase mais criativa do setor em quase vinte anos. À margem do FIB ficam os trabalhos de artistas como Tulipa Ruiz, Mariana Aydar, Roberta Sá, Emicida, Casuarina, Fino Coletivo, Criolo, João Sabiá, Otto, Móveis Coloniais de Acaju e Monobloco, só para citar alguns, sem falar em outros ícones como Ney Matogrosso, Zé Ramalho, Adriana Calcanhotto ou mesmo Djavan.

5. A questão central é que - pasmem! - Vitória da Conquista não é Salvador. A mistura a que propõem é uma fórmula muito radicada na dinâmica da economia criativa soteropolitana, com uma diversidade de atividades, opções culturais e musicais muito diversas da conquistense. Soma-se a isso a diferença geográfica extrema: a primeira cidade, praieira, de clima quente e fervilhando de eventos típicos do verão, mesmo fora do verão; a outra, de clima frio, em pleno inverno e com uma dinâmica cultural muito mais atenta a exploração de outros ritmos que não falem exclusivamente de praia, sol, água de coco e pegar onda.  Daí em diante é fácil entender que os suores de praia não são os mesmos no inverno e que o famoso “tira-o-pé-do-chão” combina mais com abadá e sandália de dedo que cachecol e botas.

6. Eventos de pagode, axé, sertanejo e adjacências pipocam aos montes doze meses por ano no interior do estado. Lamento realmente que o FIB se inclua neste rol como apenas mais um e não mais como um evento construído com todo o histórico e contexto que citei. O conceito da diversidade aparente que apontam seus organizadores se perde numa ideia enganosa, sem observar o cenário em que se inserem: trazer para a programação estilos musicais que já se apresentam regularmente na região não é inovar e o máximo de mistura que se consegue assim é um feijão-com-arroz. O FIB, sob esta lógica, perde o que tinha de mais diferente: a oportunidade de abrir espaço para um fluxo de novos artistas - como foi o caso de Danni Carlos e O Teatro Mágico – num mesmo palco com bandas já consagradas, que de outra forma dificilmente poderiam vir num espetáculo deste porte na região.


A expectativa por um espaço segmentado para o pop é uma necessidade sentida e alimentada na região há muito e, até bem pouco tempo, era também bem percebida. Assim, às portas do início da nova edição, perdura a sensação visível de que o evento em 2012 teve a programação mais fraca em todas as edições, muito embora isto talvez não se reflita em números, já que o lucro é bem-vindo e necessário, vindo de onde vier, da forma que vier.

Quando digo que o FIB perdeu o tato, espero de verdade que, além da sensibilidade, o evento recupere nas próximas edições o poder de diferenciar onde de fato é frio e onde é quente em tudo isso.

Tá postado.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Concerto de Elomar na Casa dos Carneiros

Por Marcelo Lopes
 
O concerto “Ensaiando o Riachão do Gado Brabo” é um projeto que circunda as mais recentes produções do compositor Elomar Figueira. O Cantador, que nos últimos tempos tem dedicado seu processo criativo a composição de obras de maior porte, traz com este ensaio a oportunidade do público assistir ao trabalho que prenuncia o último disco de Elomar na sua fase de composição de canções.

“Ensaiando o Riachão do Gado Brabo” fará sua estreia dia 1º de Setembro, no Teatro Escola LíricaMineira - Casa dos Carneiros, às 21 horas e seguirá depois uma programação de apresentações por diversas capitais do país. No espetáculo musical, Elomar dividirão palco com o violonista, compositor e maestro, João Omar de Carvalho Mello que apresentará alguns solos do seu novo disco “João Omar interpreta Elomar: Peças para violão Solo”, com trabalhos como Prelúdio nº sexto, uma homenagem ao maestro Villa Lobos, além de Lagoa da Porta, São João Xaxado, Retirada, Trabalhadores na Destoca e Estudo nº único.

Elomar Figueira é um dos artistas brasileiros de maior densidade entre a cultura popular e erudita, bastante influenciado pela tradição ibérica e árabe que a colonização portuguesa levou ao nordeste brasileiro. Sua obra é vasta, composta de canções conhecidas do grande público, como “Arrumação” e “O Pidido”, mas também de óperas, sinfonias, concertos, antífonas, além de roteiros de cinema e romance.

O que: Concerto “Ensaiando o Riachão do Gado Brabo”
Onde: Teatro Escola Lírica Mineira - Casa dos Carneiros
Quando: 1º de Setembro, às 21h
Quanto: R$ 70,00 (ingressos limitados)
Sobre: 77 3421-4881 / atendimentorossane@gmail.com

sábado, 18 de agosto de 2012

Novo CD do Scambo gratuito para baixar

Por Marcelo Lopes

Dez anos após sua última apresentação em Vitória da Conquista, a banda Scambo retornou a cidade com um show no Viela Sebo Café, repleto de muita energia do público, fruto da vontade reprimida dos fãs do grupo de ver e ouvir novamente a sonoridade das letras inteligentes da banda que, agora lançando seu novo trabalho, traz novamente aos vocais o cantor Pedro Pondé. A realização do evento foi do Coletivo Suiça Bahiana/ Fora do Eixo.

Scambo é uma banda de Salvador que prova que existe vida inteligente além do Axé, do Pagode e do Arrocha. Em meio a um cenário em que estes três tipos de música (melhor dizendo, mercado) ocupam espaço e os ouvidos de todos sem preocupações com a diversidade ou a educação, o trabalho da banda é um alento: um som pop com claras levadas do reggae e influências declaradas de artistas como Chico Buarque, Gonzaguinha e Gilberto Gil. Segundo o release da própria banda seu trabalho “reflete em letras, ritmos e ações a moda inquisidora dos grandes centros urbanos em contraste com a vida pessoal que busca, indaga e pode se realizar”.

Afinada com o que há de mais interessante no cenário do pop rock baiano e nacional, Scambo lançou seu mais recente CD “Flare”, no último dia 16 de Agosto, no Teatro Vila Velha, em Salvador. Músicas do novo disco fizeram parte da apresentação em Conquista, que não deixou de lado também sucessos como Sol de Ninguém, O Rato, Ocê e Eu, além das versões de Geni e o Zepellin (Chico Buarque), Tigresa (Caetano Veloso) e Carcará (João do Vale). O público, entusiasmo, cantou do início ao fim, em alto e bom som.

O novo CD foi disponibilizado pela banda gratuitamente

Não deixe de ouvir... Senão o Axé pode puxar seu pé de noite.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Confira "Distraído" o novo disco de Ricardo Ayade

Por Marcelo Lopes

Todo processo criativo é um parto, partindo de onde partir. Muitas vezes é algo que não temos como segurar e simplesmente vem. O que não implica falta de trabalho e suor. Criar mexe com todas aquelas coisinhas complexas e nomes técnicos que os psicólogos costumam classificar como personalidade. O que fazemos e como nos manifestamos derivam desse conjunto de referências, da nossa interação com o mundo e com a história que construímos.

A personalidade, que nos torna a figura principal da nossa cena particular, também é o que dita como nos expressamos quando encontramos uns com os outros, formando esse Mundão-de-meu-Deus, levando-nos diariamente a buscar a arte de viver da melhor forma possível.

E é justamente do parto criativo de uma figura ímpar como Ricardo Ayade que segue a dica musical deste artigo, com o lançamento em breve de seu mais novo trabalho artístico: o CD de estreia intitulado “Distraído”.

Ricardo é ator, cantor, compositor e poeta. No meio da impossibilidade de ser menos que tudo isso, “Distraído” nasce como um disco totalmente autoral, desenhado em cima do estilo MPB que já acompanha o artista, contornado com alguns elementos do pop. Com a voz sólida e suave embalando letras bem pensadas, o trabalho tem arranjos de Alexandre Montenegro e participação especial da rapper carioca Taz Mureb em uma das faixas.

Gravar cada música é reviver cada história, na mente e no coração com a mesma intensidade com que foi vivida. Isso é bem difícil. É como revirar um grande baú de emoções guardadas, esquecidas, velhas, cheirando mofo, dessas coisas velhas que fazem você espirrar o dia inteiro”, diz Ricardo nos textos do encarte.

A expectativa pelo lançamento do CD é muito grande em Salvador e no Rio de Janeiro, lugares essenciais à sua trajetória, e já angaria admiradores como Fernando Anitelli, líder do grupo O Teatro Mágico, que, em recente entrevista no programa Prosa Cultural, tece elogios e recomenda o cuidadoso trabalho musical de Ricardo.

O CD sai em breve e até lá é possível ouvir um pouco da música de Ricardo Ayade no seu site: http://www.ricardoayade.com/

Vale a pena conferir.

Terror para a hora de dormir


Por Marcelo Lopes

O gênero Terror é uma curiosa classificação no cinema: define tipos de filmes que de alguma maneira têm o medo como elemento narrativo na sua construção imagética, que se prende ao nosso imaginário e estímula àquilo que de alguma forma nos faz sentir próximos do perigo, mesmo que irreal.
O que dá medo em uma determinada pessoa nem sempre é o que poderia assustar outra. Muitos sustos ou histórias de terror podem mesmo provocar o riso se não tiverem o cuidado exato na forma de tratar seus temas.
Assim, guardei aqui uma lista interessante de filmes que acredito manterem uma boa dose de suspense embebidas no álcool dos nossos receios escondidos, fantasias e batimentos acelerados. Recomendado para aquelas duas horas noturnas que guardamos antes de ir para a cama .


O Sexto Sentido (The Sixth Sense) – 1999
“O psicólogo infantil Malcolm Crowe (Bruce Willis) abraça com dedicação o caso de Cole Sear (Haley Joel Osment). O garoto, de 8 anos, tem dificuldades de entrosamento no colégio e vive paralisado de medo. Malcolm, por sua vez, busca se recuperar de um trauma sofrido anos antes, quando um de seus pacientes se suicidou na sua frente.”
Nunca comentem o final com alguém que nunca assistiu este filme... alguém pode morrer por isso.


Psicose (Psycho) 1960
“Cansada da vida que leva, a secretária Marion Crane rouba US$ 40 mil que deveria guardar para o chefe e foge para a Califórnia, onde encontrará o namorado. No caminho, hospeda-se num motel, onde é atendida por Norman Bates, o estranho dono do estabelecimento que parece ser dominado pela mãe”.
Clássico filme de AlfredHitchcock, Psicose é uma referência aos filmes de terror ainda hoje, não apenas pela medida certa de suspense, mas por mostrar que o perigo pode estar até mesmo no trato cortês de um atendente de hotel.


O Exorcista (The Exorcist) 1973
“Com a piora gradual dos sintomas de dupla personalidade da filha de doze anos, uma atriz descobre, com a ajuda de um padre, que a garota está possuída pelo demônio”.
Qualquer um que já esteve perto de alguém possesso sabe o medo que isto dá... principalmente se for alguém próximo, como seu chefe.


O Iluminado (The Shinning) 1980
“Um vigia, acompanhado por sua esposa e filho em um hotel pouco procurado na temporada de inverno, passa a ver coisas estranhas e a ser perseguido por forças sobrenaturais”.
Terror cozido em banho-maria, cercado de muito gelo.


Poltergeist – O fenômeno (Poltergeist) 1982
“Tudo começa com a menina conversando com o aparelho de TV e móveis que se movem sozinhos, até que em uma noite, durante uma tempestade, Carol Anne desaparece dentro do armário de seu quarto. Por acaso, em um canal de TV sem sinal, a família pode ouvir sua voz e se comunicar com a garota. Os Freeling procuram uma equipe de parapsicólogos e uma poderosa médium para trazer Carol Anne de volta, mesmo tendo que enfrentar um mundo desconhecido, espíritos furiosos e manifestações demoníacas dentro da própria casa, que esconde um segredo terrível”.
Portas batendo sozinhas e outros fenômenos inexplicáveis estão no repertório assombroso de qualquer conversa de crianças e adolescentes. Coloque tudo isso sob a batuta da produção de StevenSpielberg e a coisa fica quase lá em casa.


O Silêncio dos Inocentes (The silence of the lambs) 1991
“Uma inteligente trainee do FBI é enviada a um hospital para criminosos insanos a fim de contatar o doutor canibal Hannibal Lecter. Sua missão é convencer o louco médico a ajudá-la a resolver o caso de um psicótico assassino em série”.
Quem disse que só porque o sujeito é psicopata e antropófago ele não pode ter estilo?


Nosferatu (Nosferatu, Eine Symphonie des Grauens) – 1922
“Hutter (Gustav von Wangenheim), agente imobiliário, viaja até os Montes Cárpatos para vender um castelo no Mar Báltico cujo proprietário é o excêntrico conde Graf Orlock (Max Schreck), que na verdade é um milenar vampiro que, buscando poder, se muda para Bremen, Alemanha, espalhando o terror na região. Curiosamente quem pode reverter esta situação é Ellen (Greta Schröder), a esposa de Hutter, pois Orlock está atraído por ela”.
Ainda hoje o vampiro mais feio da história do cinema.


O Bebê de Rosemary (Rosemary’s Baby) – 1968
“Rosemary e seu marido mudam-se para um apartamento em Nova York onde encontram uma vizinhança bastante estranha. Quando Rosemary (Mia Farrow) engravida, ela passa a ter alucinações. Uma seita de bruxas deseja que Rosemary de a luz ao filho das Trevas”.
Lição de como é possível induzir o assombro apenas com a sugestão do medo.



O Chamado (The Ring) - 2002

“Rachel Keller (Naomi Watts) é uma jornalista que decide investigar a misteriosa morte de sua sobrinha. Ela percebe a relação da morte dela e de várias outras mortes com um estranho vídeo, que faz com que todas as pessoas que o assistam morram exatamente sete dias depois. Intrigada com a história, ela agora precisa descobrir um meio que impeça que a profecia se realize, já que ela e seu filho assistiram ao vídeo.”


Atividade Paranormal 1,2 e 3 (Paranormal Activity) 2009, 2010, 2011.
“Desde criança Katie (Katie Featherston) ouve ruídos estranhos, sussurros e sente sensações inesperadas. Já adulta, ela mora com seu namorado Micah (Micah Sloat), que meio cético quanto aos depoimentos resolve usar uma câmera para gravar tudo o que acontece enquanto eles dormem e vivem dentro da casa. E o que era para ser apenas uma forma de esclarecer o mistério, torna-se uma experiência intrigante e assustadora”.

“Kristi (Sprague Grayden), irmã de Katie (Katie Featherston), teve recentemente um filho com Daniel (Brian Boland), que já era pai de uma adolescente. Um dia, ao chegarem em casa, a encontram completamente revirada. Tentando evitar que a situação se repita, Daniel compra um sistema de segurança que instala câmeras em diversos cômodos e no lado de fora da casa. Ao mesmo tempo o casal e a adolescente têm por costume filmar tudo o que acontece ao seu redor. Até que um dia situações estranhas começam a acontecer, o que faz com que o trio acredite que a casa é mal assombrada”.

“Dennis (Christopher Nicholas Smith) adora filmar e possuí até uma ilha edição em casa, montada na garagem. Casado com Julie (Lauren Bittner), com quem tem duas lindas filhas Katie (Chloe Csengery) e Kristi (Jessica Tyler Brown), ele resolve propor a ela que seja feita uma filmagem de uma transa dos dois. O que ele não contava é que um terremoto iria atrapalhar o momento de fetiche, mas também revelaria uma estranha imagem em sua gravação. Curioso com o fato, ele mostra para a esposa que não liga e também para um amigo (Dustin Ingram), que fica igualmente intrigado. Os dois acabam instalando mais de uma câmera na casa e o que eles passam a ver marcará para sempre o futuro de todos”.

Seguindo a lógica de “poderia ter sido feito por mim mesmo com aquela câmera vagabunda que eu peguei emprestado ontem”, o que chama a atenção destes tipos de filmes é a textura quase amadora dos “registros” sobrenaturais.

Carrie, a Estranha (Carrie) – 1976
“Carrie White é uma jovem que não faz amigos em virtude de morar em quase total isolamento com sua mãe, uma pregadora religiosa fanática. A garota é menosprezada pelas colegas e Sue Snell, uma das alunas que zombam dela, fica arrependida e pede a seu namorado que convide Carrie para um baile no colégio. Mas Chris Hargenson, uma aluna que foi proibida de ir à festa, prepara uma armadilha para ridicularizar Carrie em público. O que ninguém imagina é que a jovem possui poderes paranormais e muito menos conhece sua capacidade de vingança quando está repleta de ódio.”


Sexta feira 13 (Friday the 13th) – 1980
“Depois de muito tempo fechado, alguns monitores vêm passar uns dias no local que por muitos ficou conhecido como o “Acampamento Sangrento”. Ignorando os avisos, eles preferem se divertir e passar o final de semana cantando e fazendo amor. Mas não esperavam que alguém fosse brincar de “Mate o Monitor”. Assim, um por um eles vão morrendo sem que os outros descubram”.
Este segue a regra do original-é-sempre-o-melhor.


Cemitério Maldito (Pet Sematary) – 1989
“Recentemente os Creeds se mudaram para uma nova casa nos arredores de Chicago. A casa é perfeita, exceto por duas coisas: os reboques, que vivem fazendo barulho na estrada, e o misterioso cemitério no bosque atrás da casa. Os vizinhos dos Creeds estão relutantes em falar sobre o cemitério e eles tem um bom motivo para tal comportamento. Gradativamente o casal toma conhecimento da verdade e ficam chocados ao saberem do perigo que seus filhos correm. Quando o gato da família morre atropelado, eles o enterram em um cemitério índio que tem o poder de ressuscitar o que for deixado naquele terreno, mas as consequências são inimagináveis”.
Mais um ótimo filme baseado em livros de Stephen King.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Memória de Minhas Putas Tristes agora é filme


Por Marcelo Lopes

Havia achado, sempre, que morrer de amor não era outra coisa além de uma licença poética. Naquela tarde, de regresso para casa outra vez, sem o gato e sem ela, comprovei que não apenas era possível, mas que eu mesmo, velho e sem ninguém, estava morrendo de amor. E também percebi que era válida a verdade contrária: não trocaria por nada neste mundo as delícias do meu desassossego.” 


O trecho é de uma das mais doces passagens do livro “Memória de Minhas Putas Tristes”, de Gabriel Garcia Márquez. O escritor colombiano recebeu o Nobel de Literatura de 1982 pelo conjunto de sua obra, que entre outros inclui os aclamados livros Cem Anos de Solidão, Amor nos Tempos do Cólera e Crônica de uma Morte Anunciada. O autor foi responsável por criar o realismo mágico na literatura latino-americana. Gabito, como também é conhecido, se aposentou da produção Literária em 2009, quando foi diagnosticado com uma doença degenerativa, que em nada lhe afeta fisicamente, mas ironicamente, passou a lhe tirar a memória, fonte da criação de personagens inesquecíveis da literatura universal.

Em 2011, Memória de minhas Putas Tristes foi tomado pelas mãos do diretor dinamarquês HenningCarlsen, trazendo para as telas a história o cético El Sabio, que às vésperas de completar 90 anos resolve se dar como presente uma noite de amor com uma adolescente virgem, aquela que viria a ser a sua "delgadinha". O velho jornalista de um pequeno povoado do México vê-se, assim, enredado nas sutilezas de um envolvimento construído na ternura, levando-o, no final da vida, para uma fronteira até então desconhecida: a paixão.

O filme não se situa na fidelidade à obra nem numa leitura livre da história do escritor, e, ao optar pelo meio termo, pelo meio termo mesmo se classifica: nem ruim nem bom. Para aqueles que não conhecem a obra de Gabriela Garcia Márquez, o filme oferece uma narrativa relativamente atrativa e cercada de piadinhas bem colocadas, mas passa longe do virtuosismo e leveza dos textos do escritor, se perdendo em tentativas de linguagens que não convencem e flashbacks aos montes.

De fato, vale a dica para os que ainda não leram a obra do colombiano como uma introdução a este universo de textos mágicos, repletos de nuanças entre o céu e a terra, muito além do que soube captar essa vã adaptação.


quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Um Corpo que Cai no topo da Lista

O crítico de cinema e professor da Ufba, André Setaro, publicou recentemente um artigo sobre a mais nova lista do Maiores Filmes de Todos do Tempos, onde o imbatível Cidadão Kane (1941) cede lugar pela primeira vez ao clássico de Alfred Hitchcock, Um Corpo que Cai (1956). O texto, mais do que uma aula, é um primor, talhado entre a clara compreensão histórica do cinema e a paixão pela sétima arte.

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O tempo é o melhor juiz para o julgamento dos filmes. Algumas obras cinematográficas, tão exaltadas nos anos 50, caíram, nos tempos atuais de seu pedestal para um segundo plano e outras, desconsideradas, e nunca inclusas numa lista das melhores, subiram, com o passar do tempo. É o caso de Um corpo que cai (Vertigo, 1958), que, numa recente pesquisa da revista inglesa Sight&Sound, por 34 votos de diferença, desbancou de seu topo o clássico e impertubável Cidadão Kane (Citizen Kane, 1941), de Orson Welles, como o maior filme de todos os tempos. A pesquisa reuniu 846 especialistas em cinema, críticos, ensaístas, acadêmicos, historiadores. É uma enquete muito séria e feita com extremado rigor. A notícia se espalhou pelos jornais semana passada: Um corpo que cai, do velho Hitch, é considerado o maior filme de todos os tempos. Se fosse fazer uma lista, ainda conservaria Kane no topo, mas incluiria, sem dúvida, Vertigo, entre os cinco maiores momentos do cinema. Cada um tem a sua lista particular. Cada um tem seus filmes preferidos. Mas o resultado da enquete mostra que Um corpo que cai, realmente, é um monumento da chamada sétima arte.

Descoberto como um autor de filmes genial pelos críticos da revista francesa Cahiers du Cinema, Hitchcock passou muito tempo elogiado apenas pela sua capacidade de despertar emoções e submeter o espectador à agonia do suspense. Em Fronteiras do cinema, de Walter da Silveira, o grande ensaísta baiano chega a cometer um equívoco no capítulo As vertigens de Alfred Hitchcock no qual aborda, com extrema superficialidade, a sua "metafísica", restringindo-o a ser um provocador de meras vertigens. Foi preciso que François Truffaut, Jean-Luc Godard, Eric Rohmer, Claude Chabrol, entre outros, fizessem ver, através das páginas do Cahiers du Cinema, que Hitchcock, muito mais do que um mero "mestre do suspense", era um autor completo, um inventor de fórmulas, um dos mais interessantes realizadores cinematográficos da história. Em Le cinema selon Hitchcock, livro de Chabrol e Rohmer, estabelece-se a prova irrefutável da maestria do autor de Vertigo, a chegar mesmo os dois críticos a afirmar que nos "filmes de Hitchcock o conteúdo é a forma", expressão acabada da conjugação perfeita entre o elo sintático (a linguagem) e o elo semântico.

Hitchcock, e não se sabe o motivo do gesto, resolveu, em meados dos anos 60, retirar Vertigo, assim como outros de seus filmes, de circulação. Vintes anos se passaram sem que o filme pudesse ser visto ou reavaliado até que, com sua morte, em 1980, Pat, sua filha única, resolveu pô-lo novamente em evidência em 1984, com a distribuição mundial de um Pacote Hitchcock composto por Um corpo que cai, Janela indiscreta, Festim diabólico, O terceiro tiro, e O homem que sabia demais. O lançamento desses filmes fez vir de Hollywood o legendário James Stewart (que tinha participação na produção deles e, portanto, nos lucros porventura auferidos).

James Stewart é Scottie, inspetor de polícia em licença médica porque possuidor de acrofobia (vertigem em lugares altos), que acabou por deixar um colega morrer em ação. É chamado por um velho conhecido (Tom Helmore) para que vigie sua mulher, Madeleine (o biscoito proustiano?), interpretada por Kim Novak. O marido lhe diz que a mulher, em grande instabilidade emocional, está a ponto do suicídio. Scottie começa a acompanhá-la de longe, a princípio, pelas ruas de São Francisco, e chega a salvá-la de um afogamento. O seu trabalho, porém, não contava com um acidente de percurso: vem a se apaixonar por ela. Não consegue, porém, impedi-la que se atire da torre de uma igreja (a vertigem lhe impede a salvação de Madeleine). Com profundo sentimento de culpa, entra em grave depressão até que, já restabelecido, encontra uma mulher extremamente parecida (uma sósia, a rigor) a Madeleine, que se chama Judy. Aproximando-se dela, procura modificar-lhe alguns detalhes e reconstruir, nela, a amada morta. A verdade, no entanto, e Hitchcock apenas fornece as informações para o público, a deixar Scottie sem saber de nada, é que Madeleine não morreu e que Judy é, apenas, uma mulher comum que fora contratada pelo amigo de Scottie para "representar" Madeleine. E quem cai da torre é a mulher do contratante, que a quer ver morta. Madeleine, o álibi perfeito.

O exegeta Noel Simsolo, que escreveu um ensaio sobre a obra de Hitchcock, diz que Um corpo que cai tem um universo de ópera wagneriana e do esoterismo de Bartok, e no filme se assiste ao nosso próprio sonho nos seus prolongamentos nefastos. Segundo Simsolo, "a tarefa que Scottie se atribui é um plano ignóbil e perverso que o obrigará a agir, amar e sofrer, a deixar assim sua impotência e passividade. (…) A segunda parte, mostrando a tentativa de Scottie de reencontrar, pelo artifício, a primeira mulher (Madeleine) na segunda (Judy) nos conduz ao limite do atroz em plena abstração da proposta. Porque Madeleine e Judy são a mesma mulher. A cor dos cabelos, as roupas, o penteado, (ou seja, a aparência), diferem, mas são justamente estes detalhes que nos levam, como a Scottie, à vertigem e ao fetichismo. Para nós, como para ele, Scottie recriou esta aparência para reencontrar o ser irreal do quadro sem expressão (Carlotta). E as lágrimas lhe chegam aos olhos quando ela aceita transformar-se na outra, lágrimas de Scottie que nos comovem e nos transformam em uma parte integrante do filme."

Com bem salientou Inácio Araújo em seu imprescindível Alfred Hitchcock: o mestre do medo (Encanto Radical, Brasiliense, 1982), "trata-se de (recriar) uma mulher a partir da imagem de uma morta, ou seja: fixar a idéia como fundadora do mundo e o mundo como produto da imaginação (…) Filme sobre a criação de uma imagem, Um corpo que cai desenvolve a hipótese de reconstituir um objeto imaginário idêntico ao real. Filme de exploração dos limites, evolui no sentido de apagar a linha que separa o real e o imaginário, fendendo (e negando) o universo que captamos ordinariamente pela introdução de um acontecimento extraordinário (a ressurreição de Madeleine, falsa na realidade porém verdadeira por sua conseqüências)."

Obra metafórica em muitos sentidos (a vertigem, a queda, a árvore milenar, o rio e o mar, a mulher, o amor, a impotência, a morte e o desejo da morte, o medo da morte do desejo, o mito do amor perfeito e eterno…), Hitchcock atinge em Vertigo o apogeu da arte clássica (que implica imitação) e, num mesmo gesto, ultrapassa-a, afirmando a supremacia da construção sobre o realismo e a verossimilhança.


OS VINTE MAIORES FILMES DE TODOS OS TEMPOS

1- Um Corpo que Cai (Hitchcock, 1958) – 191 votos 2- Cidadão Kane (Welles, 1941) – 157 votos 3- Era uma Vez em Tóquio (Ozu, 1953) 4- A Regra do Jogo (Renoir, 1939) 5- Aurora (Murnau, 1927) 6- 2001 – Uma Odisséia no Espaço (Kubrick, 1968) 7- Rastros de Ódio (Ford, 1956) 8- O Homem da Câmera (Dziga Vertov, 1929) 9- A Paixão de Joana d’Arc (Dreyer, 1927) 10- 8 ½ (Fellini, 1963) 11- O EncouraçadoPotemkin (Sergei Eisenstein, 1925) 12- O Atalante (Jean Vigo, 1934) 13- Acossado (Jean-Luc Godard, 1960) 14- Apocalypse Now (Francis Ford Coppola, 1979) 15- Pai e Filha (Ozu Yasujiro, 1949) 16- A Grande Testemunha (Robert Bresson, 1966) 17- Os Sete Samurais (Kurosawa Akira, 1954) – 48 votos 17- Quando Duas Mulheres Pecam (Ingmar Bergman, 1966) – 48 votos 19- O Espelho (Andrei Tarkovsky, 1974) 20- Cantando na Chuva (Stanley Donen & Gene Kelly, 1951) 20- A Aventura (Michelangelo Antonioni, 1960)