Por Marcelo Lopes
O que o trabalho de atores consagrados
na televisão brasileira como Nuno Leal Maia, Vera Fischer, Antonio Fagundes,
Reginaldo Faria e Sonia Braga têm em comum além de décadas de notoriedade e
reconhecimento público? Pairam sobre eles o fato de terem sido astros no
gênero mais popular das décadas de 1970/80, um estilo de filme que entrou para a história do cinema
brasileiro com o nome de Pornochanchada.
Na história do nosso cinema este gênero foi responsável por um
período de descrédito na produção nacional até o início dos anos 90, quando
dedicar um tempo livre para ir ao cinema assistir a um filme brasileiro,
segundo muitas pessoas, não valia o ingresso. Em termos chulos,
filme nacional era sinônimo de putaria. Essa imagem de rejeição perdurou muito tempo, associando o que era produzido pelo cinema no país a um amontado de filmes de má qualidade.
A história da Pornochanchada se confunde
com a lógica do pão-e-circo que funciona tão bem no Brasil. Na verdade, mais
circo que pão. Assim como ocorre hoje com os programas de TV de imprensa marrom,
com altos índices de audiência, os filmes deste gênero ganhavam a fidelidade do
público dialogando com o que há de mais cru no instinto humano. Misturando
elementos de linguagem fáceis, muita comédia, apelo excessivo ao sexo em
realizações de baixa qualidade técnica, fracos roteiros em meio a um desfile de
dezenas de mulheres nuas por película, estes filmes feitos para o puro
entretenimento das massas eram, na verdade, o reflexo de um período que
pretendia nos desobrigar do pensar crítico: a Ditadura Militar.
Boca do Lixo, São Paulo. Por Ozualdo Candeias. |
Nesta época, o cinema era uma ferramenta de discurso, instrumento de revolução do qual se valiam muitos expoentes
do pensamento artístico e político brasileiro, entre eles o baiano Glauber Rocha.
Sem encontrar empecilhos com a censura – ao contrário de obras que impeliam o
público a questionar a realidade de um país sob um regime totalitário – os filmes
da pornochanchada eram estimulados a ocupar as grandes salas dos cinemas do
Brasil. O sistema anual de quotas de exibição para filmes nacionais faziam com
que o mecanismo, criado para incentivar a cultura brasileira, se tornasse um
escoadouro do alto volume dos filmes baratos e rentáveis do gênero, cuja maior
parte da produção vinha da Boca-do-Lixo paulistana, região conhecida por suas boates
e bordéis. Eram filme independentes, quase sempre sem financiamento público,
mas com um rentável mercado de venda e distribuição.
Xuxa e a famosa cena plolêmica com o menino de 12 anos |
Os filmes de temática erótica levaram
os atores e atrizes citados para um
estrelato meteórico, sem falar de autores como Silvio de Abreu, referência da qual muitos
tentam apagar até hoje. Um caso emblemático é o da apresentadora Xuxa Meneghel,
que ainda hoje tenta expurgar da memória cinematográfica brasileira as cópias
do filme “Amor, Estranho Amor”(1979), do diretor Walter Hugo Khouri, um caso à parte na cinematografia do estilo, um diretor
singular com obras realmente interessantes. Apesar de figurar entre as poucas realizações com melhor tratamento de produção e texto do gênero, o filme ainda hoje
persegue a biografia da Rainha dos Baixinhos e se tornou Cult e kitsch no raking
de filmes baixados na internet. Outros nomes “enobrecidos” pela pornochancada, mas
hoje esquecidos, como David Cardoso, considerado o arquétipo do “macho
brasileiro”, eram garantia de bilheteria por semanas nos cinemas.
Cena de "Bonitinha, mas Ordinária", com Lucélia Santos |
Segundo a historiadora Cristiane Nova,
ao contrário dos filmes do Cinema Novo que encontravam dificuldades em acessar
o público por sua linguagem complexa, os filmes da pornochanchada falavam ao
público de forma direta e sua rentabilidade era visível em contraponto aos
filmes dos cineastas cinemanovistas: uma ironia, já que o conteúdo dos filmes politizados
eram feitos para se dirigir diretamente ao povo. Somado a isso, o processo de
franca expansão econômica do país nas décadas que aninharam o gênero eram muito
mais bem-vindo nos esquemas industriais da Boca do Lixo que na lógica de
contestação do Cinema Novo.
A pornochanchada fez bilheterias
memoráveis, povoando o imaginário de milhares de pessoas no Brasil, com uma
evidente contribuição para o aumento das espinhas de muitas gerações de
adolescentes. São exemplos destes, os filmes Mulher Objeto e A Árvore dos Sexos,
de Silvio de Abreu, Giselle, Bem Dotado, o Homem
de Itu, Histórias
que Nossas Babás não Contavam, Como É Boa Nossa
Empregada, As Cangaceiras
Eróticas, As
Intimidades de Analu e Fernanda e O Convite ao Prazer.
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