Por Rafael
Flores
A cultura é um dos campos de atuação mais complexos
e plurais, com suas diversas linguagens, especificidades, públicos e segmentos.
Porém, ela possui um histórico marcado pela perca da tradição no
desenvolvimento e implementação de políticas públicas voltadas para a mesma. É
indiscutível a importância desse processo, principalmente no âmbito municipal,
que é a base local de uma grande ação. O fortalecimento desse setor, vem sendo
construído ao longo dos ultimos anos em território nacional, através de ações
do Ministério da Cultura, principalmente de financiamento e fomento.
Em Vitória da Conquista, a existência de uma
secretaria voltada para a Cultura, Turismo e Esportes, é recente. Porém, o
município já possuía uma prática de eventos e ações insipientes há
mais tempo, a exemplo da Miconquista (carnaval fora de época que existiu entre
os anos de 1989 e 2008 na cidade). Na atual gestão, algumas ações podem ser
facilmente pontuadas como fixas no calendário anual da cidade, a exemplo de eventos
como o Natal da Cidade e o Forró Pé de Serra do Peri Peri. Segundo o atual
secretário municipal de cultura, Gildelson Felício, “o fato da comunidade e dos
artistas sempre criarem uma expectativa sobre esses eventos, acabam por
transformá-los numa ação de governo, a qual independente do futuro prefeito, a
cidade vai cobrar por sua execução”. Além dos eventos, a cidade possui alguns
projetos governamentais mais antigos, oriundos de outras gestões, como a
Filarmônica e o Conservatório Municipal, um dos poucos gratuitos no interior da
Bahia.
Mesa sobre políticas culturais no Festival da Juventude/ Foto: Rafael Flores |
Um dos principais objetivos das ações de políticas
públicas para a cultura, além de facilitar o acesso da população, é provocar o
debate e a formação cultural da sociedade, através dessas iniciativas. Tornar
acessível o conhecimento cultural contribui imensamente na preservação da
memória e identidade de uma nação. Por isso, é de extrema importância que as
gestões públicas e privadas que promovem iniciativas com financiamento público,
abram esse tipo de espaço para os debates. Em Vitória da Conquista, podemos
destacar alguns projetos como a Mostra Cinema Conquista, realizada em parceria
com a Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, o próprio São João - Forró Pé
de Serra do Peri Peri, através dos espaços lúdicos e o recente Festival da
Juventude, que contou com oficinas, mesas redondas e intevenções em sua
primeira edição, nesse ano.
Ainda segundo o secretário Gildelson Felício, o
Festival é a mais nova aposta da Prefeitura Municipal de Vitória da Conquista
por conta do seu bom resultado: “Consideramos altamente positiva essa primeira
experiência com o Festival da Juventude pela quantidade de jovens que
participaram e pela qualidade das palestras, oficinas e debates, além da parte
musical que trouxe pra cidade grupos alternativos que não são pautados pelas
mídias tradicionais”. Portanto, este tende a ser o terceiro grande evento da
prefeitura e o objetivo é que o Festival cresça e dialogue com os
movimentos de juventude, assim como foi feito nesta primeira construção.
Pretende-se torná-lo mais amplo e democrático e abranger além da
juventude universitária, as juventudes de campo e de periferia”. Pedro
Massinha, produtor cultural e dono da empresa Massicas Produções, reforça a
necessidade de programas culturais vindos da prefeitura que atinjam o público jovem
e para necessidade deste público além de se interessar pelo consumo, se
interesse também pela produção, prestando atenção em novos nomes da música e em
eventos que agreguem a comunidade.
As discussões sobre cultura no âmbito governamental
são recentes no Brasil. Mesmo assim, o país já conta com um Plano Nacional de Cultura, sancionado pelo presidente Lula, em 2010, e é signatário da Convençãoda Diversidade Cultural da UNESCO, desde 2005. Esses dois documentos são fruto
de um amplo debate que envolveu governo e sociedade. Para Vitória da Conquista,
que pretende instituir um sistema de cultura, o caminho deve ser o mesmo –
discutir exaustivamente e continuadamente com a sociedade os caminhos possíveis
para a cultura conquistense. Em 2011, a cidade além de promover sua Terceira Conferência Municipal de Cultura, sediou as conferências territorial e
estadual. A necessidade de se estabelecer um sistema municipal de cultura foi
um dos eixos principais da primeira, que aconteceu no dia 10 de setembro.
O pouco orçamento público voltado para o setor e as
equipes reduzidas nas secretarias, foi uma das questões levantadas na época. O
que, para Gildelson Felício, seria resolvido e melhor debatido com um Conselho
de Cultura ativo na cidade. No entanto, a sua atual composição é do governo
anterior e cerca de 50% dos membros, segundo o secretário, desligou-se, ou
seja, a entidade não tem funcionado. O secretário nos informou que houve a
tentativa de se reativar tal entidade durante a conferência, o que foi rebatido
por ele e por outros, alegando a possibilidade de meios mais democráticos para
tal.
Agora em 2012, serão nomeados alguns nomes, através
de decreto do prefeito Guilherme Menezes, dentre eles, representantes de
entidades culturais, como o programa ProLer e a Casa da Cultura. Estes nomes
farão parte do conselho por um ano, tempo no qual serão responsáveis por
destrinchar e tornar executáveis as propostas de Sistema de Cultura obtidas na
Conferência, além de desenvolver uma melhor maneira de se eleger o próximo mandato.
“Uma cidade do porte de Conquista não pode ficar com o conselho de cultura
desativado, pois quando tiver uma demanda que precise ser decidida pela
instância, fica inviável e enquanto não se elege um novo, o antigo, nomeado
pelo prefeito Zé Raimundo, continua ativo”, diz o secretario.
Orlando
Senna/ Foto: Rafael Flores
|
O historiador e produtor cultural Marcelo Lopes,
afirma que não existem políticas públicas para cultura e o diálogo com o poder
público e com as empresas privadas são quase nulos neste sentido. Para ele, a
iniciativa pública tem muitas vezes a necessidade de parcerias na realização de
atividades culturais, mas não se articula de modo eficiente. “Já a iniciativa
privada, mal enxerga a possibilidade real de uma relação, limitando-se na
maioria das vezes, apenas como uma forma de reduzir custos”.
Algumas outras ações de grande porte ainda estão
por vir na cidade, é o exemplo do pólo de cinema que será implantado em
parceria com a UESB. O audiovisual representa no mundo cultural um dos maiores
circuladores de investimentos e consequente movimenta-se a economia do espaço
onde se insere. Contando há dois anos com um curso de cinema e sendo o berço de
um dos maiores pensadores do cinema nacional, Glauber Rocha, Vitória da Conquista
aparece na linha de frente para se tornar a cidade do audiovisual baiano. A
curadoria está sendo feita por Orlando Senna, ex-diretor da Escola de Cinema de
Cuba e que ocupa lugar de destaque na história cultural do Brasil. “Se
começarmos a refletir sobre o que é a indústria audiovisual hoje em dia podemos
chegar a respostas grandiosas e muito boas. Algo que pode aumentar a qualidade
de vida da população de Vitória da Conquista, bem como da população de qualquer
outro lugar que veja no audiovisual essa possibilidade”, diz Senna.
Sendo pensado para a implantação há alguns anos o
Centro Cultural do Banco do Nordeste, rende especulações e discursos políticos.
No entanto, Vitória da Conquista é uma das principais cidades visadas para
ações do Banco, que realizou em parceria com o Coletivo Suíça Bahiana
(vinculado ao circuito cultural Fora do Eixo) o Festival Rock Cordel, única
edição que aconteceu no interior. André Marinho, curador cultural do Banco do
Nordeste em Fortaleza afirma que a cidade deve receber mais ações como o
festival, ainda que o processo de implantação do Centro Cultural esteja
suspenso em razão das mudanças administrativas.
É importante que se entenda que o fomento à Cultura
não é futilidade, que através de políticas públicas bem planejadas a cena
cultural de uma região pode impulsionar fortemente sua economia. O próximo
gestor deve estar atento ao que a sociedade civil e a classe artística
mobilizada tem pensado, respeitar o as decisões do Conselho de Cultura e
observar o gosto popular pelas ações pontuais já estabelecidas localmente.
Lembrando que, Vitória da Conquista ainda não tem políticas públicas culturais
estruturadas, temos apenas eventos pontuais, e estamos dependendo da reativação
do conselho para o início da construção de um Sistema. Se nos ligarmos ao fato
de que há décadas Conquista inspira e respira Cultura, estamos muito atrasados
nesse sentido, nossa Secretaria de Cultura só tem oito anos de existência e
ainda divide a verba com o Esporte e Turismo. No entanto, festivais como o da
Juventude, pode funcionar com instrumento de excitação para que os jovens
discutirem política e sociedade, podem borbulhar um pouco mais esta cena e
ajudar a por no papel tudo que se quer e que se pode fazer em relação a essas
políticas. Retomando a pergunta do título, Vitória da Conquista está sim
preparada para discutir e pensar tais planos, o que preocupa é o engajamento,
da gestão municipal e da sociedade civil, para pode transformá-los em ações.
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