Por Marcelo
Lopes
Tenho dois
filhos pequenos (e até então você me pergunta: “e daí?”). Daí que, como todo
pai – ou pelo menos deveria ser assim – me preocupo com o que eles assistem,
com o que ouvem, com o tipo de informação que são bombardeados diariamente,
sobretudo porque são crianças e- em tese – são mais suscetíveis a serem
influenciados que nós adultos.
Em tempos de
Facebook, de Big Brother, de DJ’s de ônibus (cujo repertório tem contribuído
muito para o aumento do sofrimento da classe trabalhadora) e de uma TV aberta
que cumpre fielmente o papel de “fábrica de doidos”, como diziam os mais
velhos, fico aqui pensando nas disparidades entre o quanto conseguimos avançar
quantitativamente com a tecnologia do nosso universo digital, com milhões de
acessos a um simulacro de mundo ao alcance da mão, ao tempo que, na mesma
medida, nos esvaziamos tão sintomaticamente em conteúdos.
Acostumados ao
que nos é oferecido goela abaixo na TV, nos cinemas, nas rádios e na internet,
nossos critérios seletivos estão cada dia mais rasos. Se não temos no Brasil
mais nenhum movimento cinematográfico identificável como um Cinema Novo, um
Cinema Marginal ou mesmo um Cinema da Retomada (que como já afirmei em outro
artigo nem chegou a ser um movimento), nosso empenho em alcançar este mesmo
cinema mais profissional tem já tem gerado sucessos de mercado, de público e de
até de crítica. A sombra de uma não concretizada indústria cinematográfica
brasileira ainda paira sobre nós, mas temos enfrentado tudo com mais
eficiência.
O acesso aos
filmes brasileiros (seja qual for o suporte: cinema, DVD ou mesmo infielmente
pela internet) e sua aceitação por parte das grandes platéias são resultado
desta nova configuração que se associa a chamada convergência tecnológica: a
imbricação de meios de comunicação, linguagens e consumos, afunilados cada vez
mais para suportes tecnológicos multi-tarefas, a exemplo dos aparelhos de
telefonia móvel e tablets.
Se a
possibilidade de produzir mais, veicular mais e experimentar mais é uma
realidade, o volume de besteiras que nos empurram para consumir também aumentou
exponencialmente. Fazer um vídeo caseiro e postá-lo no youtube ou outro site
equivalente é muito comum a qualquer sujeito com um celular habilitado com
câmera e um Movie Maker (software
padrão do Windows para edição de vídeo) no computador. As novas experiências
audiovisuais permitem um exercício tão benéfico para absorção da linguagem que
vem trazendo muita gente com ideias legais para o cenário do curta-metragem,
digital ou não.
Infelizmente,
estes são minoria.
Para cada um
bom realizador, a internet dispõe uma infinidade de outros geradores de virais
“audiovidionéticos” que publicam e difundem desde a patinha-da-cachorra-quebrada-da-rua-vizinha-da-casa-da-sua-tia
até o último cadáver da quarta-feira. E, acreditem, estes últimos têm mais
audiência. Não bastasse isso, a TV agora adotou – de vez – a exibição em
horário nobre das velhas videocassetadas da web ao invés de dar espaço para uma
oportuna e séria produção audiovisual recente que – garanto – muito mais teria
a oferecer, a um público carente de oxigenar suas mentes. Isto porque vivemos
um turbilhão de possibilidades audiovisuais nunca antes alcançado, e essa
oferta é marcada por uma característica visivelmente presente: o desvio da
atenção do conteúdo para a forma, que gera uma banalização grotesca de inúmeros
temas. Trocando em miúdos: o importante é dizer, não importa o quê, e se o que
se diz chama a atenção de um número cada vez maior de pessoas, tanto melhor.
Daí que retomo
o tema inicial: o raio de influência da indiscriminada produção audiovisual
atual, que engloba desde a mais bem produzida novela a propagandas de cervejas,
de longas-metragens blockbusters a
vídeos experimentais de escolas e registros banais em aparelhos celulares, tudo
isso ultrapassa e muito a esfera da faixa etária recomendada para crianças. Mas
estão todos disponíveis a todas idades e, muito pior, incentivados a um consumo
desenfreado.
Nosso papel
como espectadores e como formadores de opinião é ir além do óbvio, exercitar a
crítica, pensar e questionar onde está a regulamentação do Estado sobre tudo
isto, sabendo – afirmativamente – que
este mesmo critério de regulação depende sobretudo, da nossa própria
postura, da nossa auto-regulação. E não confundam isto com censura. Acredito
sinceramente que não há nada de mal em debochar de um assunto qualquer, afinal
o humor é a melhor arma de uma boa crítica. O problema é que nenhum assunto
volátil pode, ou deve, ocupar tanta atenção por tão pouco e por tão longo tempo
e alcance. Esta é a realidade da importância dada ao desimportante.
Este é o silêncio
grave que assola temas deste teor. Talvez não tão silencioso se compartilharem
no Facebook... pelo menos até que outra pessoa viaje para o Canadá.
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